DANIEL FAGUS KAIROZ
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coisa
Quando não nos impomos sobre o Objeto,
a Coisa (se) diz

a matéria atua no invisível
o invisível atua na matéria

A COISA COREOGRÁFICA:
pequena intro___________________________________________________
chamei de Coisa Coreográfica, um modo de operar e trabalhar com materiais coreográficos. Uma pequena estrutura que nos possibilita perceber o que fundamenta o nosso pensamento coreográfico, aquele fundo de pensamento que dificilmente tocamos e que rege o nosso ser-no-mundo enquanto poetas da Dança.
Esta proposição surgiu pela necessidade de tocar neste fundo que rege nossa criatividade, (muitas vezes sem nem nos darmos conta), e na maioria das vezes este fundo é composto por sedimentos de certezas, sensos comuns, pré-conceitos, vaidades, identidades, apegos estéticos, gostos,
um terreno onde a crítica se faz impossível
um fundo onde não há mais movimento, onde tudo se sedimentou.

enquanto criador, sinto que este fundo limita e constrange a liberdade em criar, nos tornando mais do que criadores de mundos possíveis, reprodutores de um mundo-já-dado e caduco,
é preciso criar uma turbulência de fundo para que coisas emerjam!
Não falo em querer ser criativo, mas liberar a criatividade. Não falo em ter controle sobre o que emerge, mas deixar emergir.
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AINDA A COISA COREOGRÁFICA
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entendendo o desejo enquanto algo muito palpável, enquanto aquilo que coloca qualquer existente em movimento: vc dobra um pano e solta, quando solta, ele se movimenta tendendo a desdobrar-se. este desdobrar-se é desejo do pano naquele momento, desejo dele em realizar aquele movimento.
há muitas implicações neste pensamento, nas práticas elas ficam cada vez mais claras, mais perceptíveis,
os cuidados precisos a adentrar este terreno pantanoso, e já tão saturado por falta de um rigor de pensamento, e pelas apequenações e empastelamentos característicos do senso-comum e do bom-senso,
é um terreno muito delicado mas que aponta para fora de determinações objetivas ou subjetivas, e isso me interessa profundamente,
e não falo de um equilíbrio entre subjetividade e objetividade, mas de outra realidade,
operar nestes níveis impessoais de desejos, movimentos, materialidades, composições, etc, me parece abrir uma possibilidade ética ao gesto coreográfico.
o princípio da Coisa Coreográfica é a escuta do desejo da Coisa.

Há um princípio básico: tudo o que existe possui desejo, sem desejo qualquer existente deixa de existir. Se não há desejo entre dois átomos eles se separam. ( chamem os físicos de força forte, força fraca, glúon, bóson, chamamos aqui de desejo )
em um grupo de pessoas ( no mínimo duas ) uma das pessoas propõe alguma organização coreográfica simples ( podendo usar pessoas ou não )
proposição esta que seja pela escuta dos desejos das materialidade em jogo nesta coreografia.
esta pessoa que está propondo deve trabalhar a coreografia até que considere apresentável, até que ela se faça coisa.
quando coisa, outra pessoa, deve assumir a coreografia e propor um novo gesto para esta coreografia. este novo gesto deve ser resultante de uma escuta do desejo desta coisa coreográfica. seja qual for o gesto, que ele seja a realização do desejo da coisa e não do coreógrafo.
novamente, esta outra pessoa que está propondo este novo gesto, deve trabalhar a coreografia até que considere apresentável, até que ela se faça outra coisa.

e assim podemos seguir ao infinito, à obra.
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o básico é esta escuta e realização do desejo do outro.

precisamos ser coisas desejantes para realizarmos o desejo de outra coisa, não é possível deixarmos de desejar, mas é diferente nos propormos a realizar nosso desejo ou o desejo do outro.
está em jogo sempre uma composição de desejos.

podemos começar apenas com uma folha de papel, mas seguindo a mesma lógica estrutural da Coisa Coreográfica, cada pessoa realiza um gesto no papel e este gesto deve ser a realização de um desejo da coisa-papel. e assim podemos trabalhar com qualquer coisa. com qualquer materialidade,
até chegarmos a operar com superestruturas onde há um complexo de desejos em jogo.
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A COISA começou como uma conversa com o martinho-da-floresta-negra e a edith-pedra q me ajudaram a pensar coreografia pra fora da objetividade e da subjetividade do mundo falogocêntrico pobre de espírito da metafísica da presença esse fora se abriu e firmou enquanto TERREYRO liberando forças coreográficas dos espaços públicos em conversas infinitas com ENCANTADOS EXUS PAMBUNGILA debaixo do viaduto encontrei com eduardo-viveiros q me apresentou ao perspectivismo ameríndio q me fez REVER a COISA enquanto MATÉRIA ENCANTADA ponte entre mundos o coreógrafo como XAMÃ conheci jera-guarani e casé-almabela-xukuru-tupinambá q me ensinaram q tudo q existe tem dono e q não é humano não então davi-kopenawa me contou também da arquitetura invisível da casa dos XAPIRIS e das danças e cantos deles e como isso move e sustenta o mundo então chegaram jordão-bruno raimundo-lulio pico-da-miração maria-a-judia e todo um povo pra conversar sobre MAGIA ARQUITETURA MUNDOS ALQUIMIA VÎNCULOS ENCANTAMENTOS e assim seguimos sendo COISA entre tantas outras COISAS em relação de respeito e dignidade atravessando o campo minado e fechado da dança-contemporânea ainda eurocentrada na direção de uma COREOCOSMOGRAFIA.

"a melhor maneira de conhecer é botando a mão na COISA mexendo tocando volvendo esfregando experimentando - experimente lavar uma calça na mão - experimente cavar um buraco - experimente furar a parede - experimente essa tensão entre o q vc quer e o q a COISA quer - com uma intuição um pensamento um anjo um daimon um movimento não é diferente"

"o Divino está presente em cada Coisa
a Coisa é manifestação do Nome-Nume
eis a Dignidade de Seer
o Objeto é a Coisa separada da sua Divindade
a Objetividade é esse esforço humano demasiado humano em arrancar o Divino da Coisa afim de tornar o mundo pequeno o suficiente para q possa ser controlado e manipulado"

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